Biomarcadores da função renal

Biomarcadores da função renal

A urina é um fluido corporal de grande importância clínica, pois fornece variadas formas de análises, com coleta facilitada e relativamente a baixo custo. As técnicas para análise de parâmetros urinários são muito utilizadas em laboratórios clínicos e são fundamentais para o diagnóstico e acompanhamento de condições urológicas e nefrológicas. Ainda, auxiliam no diagnóstico precoce de outras patologias associadas à distúrbios metabólicos como diabetes e disfunções hepáticas. Nos últimos anos, houve avanço notável dos instrumentos para o setor de urinálise, o que proporcionou a criação de tecnologias com alta confiabilidade como os equipamentos para microscopia automatizada e citometria de fluxo. Além disso, também facilitou processos de leitura de tiras de urina, por meio de leitoras eficientes e que, geralmente possuem bom custo-benefício. Também, houve mudanças nos processos pré-analíticos, aumentando-se o rigor para garantia de coleta, armazenagem, transporte e preservação das amostras.

 

AVALIAÇÃO MACROSCÓPICA URINÁRIA

As características físicas da urina podem alterar-se devido a causas variadas, como uso de medicamentos, doenças hepáticas, infecções, hematúria, dieta, desidratação e outras condições médicas.

Características avaliadas em geral:

Cor

Odor

Volume

Turbidez

 

AVALIAÇÃO QUÍMICA URINÁRIA

Os parâmetros químicos urinários são ferramentas que auxiliam no diagnóstico clínico de diversas doenças agudas e crônicas tanto do trato urinário quanto de infecções não urológicas. Nesse contexto, as tiras de urina semiquantitativas rápidas (figura 1) são frequentemente utilizadas para essa finalidade pois podem detectar até dez parâmetros urinários simultaneamente: glicose, leucócitos, cetonas, nitritos, proteínas totais, densidade, uribilinogênio, pH, bilirrubina e hemoglobina. Essa tecnologia se baseia na detecção multiplexada, da qual, cada almofada reagente é específica para um analito urinário. Quando há contato das áreas com a amostra, se dá uma reação de cor individual para cada parâmetro.

Elas podem ser lidas visualmente, porém os fotômetros e refratômetros medem a intensidade de reação de maneira mais sensível. Além disso, é possível encontrar tecnologia similar em tiras específicas para análise da relação creatinina/microalbumina, lidas em leitores personalizados.

Figura 1. Ilustração representativa de tiras bioquímicas visuais com dez parâmetros utilizadas no setor de urinálise. Uso em amostras frescas de urinas. Fonte: Adaptado de Istock.

 

Parâmetros bioquímicos principais

Ureia

Proteinas (albumina)

Ph

Células sanguineas

Glicose

Bilirrubina

Urobilinogênio

Corpos cetônicos

Nitritos

Leucocitos

Cetonas

 

Análises de proteína específica

Lipocalina associada à gelatinase neutrofílica (NGAL)

Biomarcador emergente de lesão renal aguda

 

AVALIAÇÃO MICROSCÓPICA URINÁRIA

A análise microscópica do sedimento urinário é importante para confirmar os achados nas tiras de urina e permite a identificação de elementos renais que não são abordados nos parâmetros químicos ou macroscópicos. Além disso, fornece informações mais precisas sobre condições inflamatórias ou infecciosas.

Apesar de depender de várias etapas para sua conclusão como centrifugação, decantação e ressuspensão da amostra de urina, a microscopia manual ainda é, umas das técnicas mais utilizadas na urinálise. E mesmo que, atualmente, alguns equipamentos altamente modernos sejam capazes de executar a microscopia automatizada baseada em reconhecimento de padrões, para uso dessa tecnologia, é necessário que um analista bem treinado reclassifique os achados pelo sistema, para correção de alguma imprecisão reportada.

Outras tecnologias com maior precisão e exatidão podem ser empregadas para contagem de elementos urinários, como os citômetros de fluxo ou equipamentos que utilizam captura digital, capazes de reduzir significativamente o trabalho manual. Porém, em relação a outros métodos, esses são mais onerosos e depende de estrutura laboratorial mais complexa, manutenção e calibragem regulares. Além disso, são menos precisos quando é necessária avaliação morfológica de células epiteliais tubulares renais, cilindros e alguns tipos de cristais.

 

Elementos microscópicos

Exemplo de condição médica associada

 

Cristais e Cilindros anormais

 

Nefrolitíase;

lesão renal aguda;

produção endógena de cristais;

doenças genéticas;

exposição à medicamentos;

distúrbios metabólicos.

Células epiteliais renais

 

Indicativo de lesão tubular renal

 

Leveduras

Presença de microrganismos

 

Leucócitos (piúria)

Indicativo de inflamação geniturinária

Hemácias

Glomerulonefrite aguda;

Litíase;

Traumas;

Malignidade;

Interferente: menstruação (em caso de

amostra feminina).

 

Figura 2. Exemplos estruturais de elementos encontrados em sedimentos urinários, visualizados por microscopia óptica. Cristais do tipo cistina; células epiteliais tubulares; Cândida albicans; campo com leucócitos e hemácias. Fonte: Adaptado de micologiaclinicauf.

 

Outros elementos microscópicos

Espermatozóides

Bactérias

Artefatos como cabelo, pólen, amido

Muco

Lipídios

 

PARÂMETROS DE DILUIÇÃO

Relação albumina/creatinina

Gravidade especifica

Condutividade urinária

Osmolalidade

 

FATORES INTERFERENTES NA URINÁLISE

O processo de análise da amostra urinária é crítico desde à fase pré-analítica à interpretação clínica final, pois vários fatores podem alterar características importantes dessa matriz amostral. Dessa forma, é necessário que os procedimentos de coleta, transporte, preparação e análise sejam bem definidos e padronizados, para fornecer resultados finais confiáveis.

As melhorias no processo analítico, como padronização de reagentes e instrumentação, além da aplicação de tecnologias informacionais no contexto de garantia da qualidade contribuíram para redução de erros laboratoriais nessa fase. Desse modo, os maiores erros estão nas etapas pré-analítica, da qual, geralmente são os próprios pacientes que fazem a coleta da amostra. Assim, para que as outras fases analíticas sejam possíveis, é necessário que os laboratórios orientem os pacientes de forma eficiente sobre a preparação ideal de amostragem. E, não somente sobre as instruções de coleta, mas atentar sobre as possíveis causas interferentes. Para isso, treinamentos específicos devem ser aplicados aos colaboradores laboratoriais de forma a promover ativamente o incentivo à coleta adequada ao paciente.

 

 

 

 

Fatores interferentes (amostragem)

  • Contaminação bacteriana
  • Luz e temperatura
  • Agentes de contraste
  • Exercícios físicos
  • Alimentos e medicamentos
  • Conservantes
  • Ácido ascórbico
  • Volume insuficiente
  • Frasco coletor inadequado

 

Além dos erros de coleta da amostra, que podem ocasionar interferência nas outras etapas da urinálise, tempo e temperatura entre a amostragem e análise podem diminuir a qualidade dos resultados urinários. Em geral, as amostras devem ser testadas em até 2 horas após a coleta em temperatura ambiente, pois após esse período alguns analitos e partículas podem perder estabilidade, a depender de pH e temperatura. Estudos demonstram que pH alcalino, baixa osmolalidade e baixa densidade relativa induzem lise de leucócitos e outras partículas urinárias. Para diminuir a problemática desses quesitos, pode-se utilizar frascos coletores com conservantes, desde que os analitos testados não sejam alterados com o aditivo referido. Ainda, é possível manter a amostra sob refrigeração, respeitando o limite de tempo para cada análise, geralmente não ultrapassando 24 horas.

 

Fatores interferentes (armazenamento e transporte)

  • Tempo entre amostragem e análise
  • Temperatura

 

 

Elaborado por MsC. Angélica Cunha

Data: 05/05/2023

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

Penders J, Fiers T, Delanghe JR. Quantitative evaluation of urinalysis test strips. Clin Chem2002;48:2236–2241.

 

Penders J, Fiers T, Giri M, Wuyts B, Ysewyn L, Delanghe JR. Quantitative measurement of ketone bodies in urine using reflectometry. Clin Chem Lab Med2005;43:724–729.

 

Park J, Kim J. Evaluation of iQ200 automated urine microscopy analyzer. Korean J Lab Med2008;28:267–273.

 

Matthijs OyaertJoris Delanghe. 2019. Progress in Automated Urinalysis. Ann Lab Med. Disponível em: <https://ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6143458/>

 

Joris R. Delanghe, Marijn M., Speeckaert. Preanalytics in urinalysis. Clinical Biochemistry.2016.

Disponível em: <https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0009912016304623?via%3Dihub>

 

Sonali D. Advani. Christopher R. Polage, Mohamad G. Fakih, Deconstructing the urinalysis: A novel approach to diagnostic and antimicrobial stewardship. 2021. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC8486290/>

 

Marijn Speeckaert. Preanalytical requirements of urinalysis. Joris Delanghe. 2014. Disponível em: <https://www.biochemiamedica.com/en/journal/24/1/10.11613/BM.2014.011/fullArticle>

 

Hoenig, Melanie P.; Mena, Jose D.; Lecker, Stewart H. More than meets the I(ris): Use of manual urine microscopy to complement automated findings in acute kidney injury. Practical Laboratory Medicine. 2022.

Disponível em: <https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2352551722000063?via%3Dihub>

 

Résimont, Guillaume; Piéroni, Laurence. Urinary strips for protein assays: easy to do but difficult to interpret! Edith Bigot-Corbel, Etienne Cavalier & Pierre Delanaye. 2021. Journal of Nephrology. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007/s40620-020-00735-y.

 

 

 

Add a Comment

Your email address will not be published.

EnglishBrazil