Cinomose Canina

Cinomose Canina

ETIOLOGIA

A cinomose canina é uma doença altamente contagiosa que afeta cães e outros carnívoros, com distribuição mundial. O agente etiológico é o Vírus da Cinomose Canina (Canine Distemper Virus, CDV), pertencente ao gênero Morbillivirus, da família Paramyxoviridae. Este vírus é composto por um filamento de RNA de fita única, envolto por um nucleocapsídeo e circundado por um envelope lipoproteico derivado da membrana celular do hospedeiro. O envelope viral contém glicoproteínas específicas: a proteína H (hemaglutinina), responsável pela ligação do vírus às células-alvo, e a proteína F (fusão), que facilita a fusão da membrana viral com a célula hospedeira (Figura 1). O CDV causa uma infecção sistêmica que envolve múltiplos sistemas do organismo e leva a manifestações clínicas diversificadas.

Figura 1. Estrutura do vírus da Cinomose. (E, envelope de lipoproteína; F, proteína de fusão; H, hemaglutinina; L, proteína grande; M, proteína da matriz; N, nucleocapsídio; P, polimerase proteica.) Fonte: Greene, G.E. Infectious Diseases of the Dog and Cat, Elsevier, 2012.

EPIDEMIOLOGIA

O CDV possui uma ampla variedade de hospedeiros, incluindo membros das famílias Canidae, Ailuridae, Hyaenidae, Mustelidae, Procyonidae, Ursidae, Viverridae e Felidae. O vírus é relativamente lábil no ambiente, e sua propagação ocorre a partir do sétimo dia após a inoculação. Embora a doença possa afetar cães de qualquer idade, é mais frequente em cães não vacinados e em filhotes entre 12 e 16 semanas de idade, quando a imunidade passiva conferida pelos anticorpos maternos diminui. Filhotes mais jovens, que receberam concentrações insuficientes de anticorpos maternos, também estão em maior risco de infecção.

O CDV, mais abundante nos exsudatos respiratórios, comumente se dissemina por exposição a aerossóis ou gotículas respiratórias. Contudo, o vírus pode ser isolado, embora menos frequentemente, de outros tecidos e secreções corporais, incluindo a urina. A excreção viral pode persistir por 60 a 90 dias após a infecção, embora períodos mais curtos de propagação sejam predominantes. Em populações urbanas de cães, o vírus é mantido pela infecção de animais recém-infectados e filhotes suscetíveis. Apesar de a imunidade ao CDV, seja por infecção natural ou vacinação, ser prolongada ou vitalícia, ela não é absoluta. Cães que não recebem a imunização periódica podem perder a proteção e infectar-se após estresse, imunossupressão ou contato com indivíduos doentes. Muitos cães suscetíveis podem ter infecção subclínica e eliminar o vírus sem sinais clínicos evidentes. Embora a maioria dos cães recuperados elimine completamente o vírus, alguns podem continuar a abrigá-lo no sistema nervoso central (SNC).

 

PATOGENIA

Infecção Sistêmica

O vírus inicia sua replicação no trato respiratório superior cerca de 24 horas após a inoculação. A partir desse local, o CDV multiplica-se nos macrófagos e dissemina-se por meio dos linfócitos para as tonsilas e linfonodos brônquicos. Por volta de 14 dias pós-inoculação (PI), a maioria dos animais elimina o vírus dos tecidos sem apresentar sinais clínicos. Cães com níveis intermediários de resposta imune, entre os dias 9 e 14 PI, podem apresentar disseminação viral para tecidos epiteliais, resultando em sinais clínicos que, em alguns casos, podem ser resolvidos com o aumento do título de anticorpos. Hospedeiros com resposta imunológica insuficiente, entre os dias 9 e 14 PI, apresentam disseminação viral para múltiplos tecidos, incluindo a pele, glândulas exócrinas e endócrinas, além do epitélio dos tratos gastrointestinal (TGI), respiratório e geniturinário. A eliminação do vírus da maioria dos tecidos está associada à recuperação e ao desenvolvimento de imunidade a longo prazo, e os eventos patogênicos geralmente se desenrolam em um período de 1 a 2 semanas. Contudo, essa proteção pode ser comprometida em situações de exposição a cepas altamente virulentas, altas cargas virais ou condições de estresse e imunossupressão.

Infecções bacterianas secundárias frequentemente complicam os sinais clínicos da doença nos tratos respiratório e TGI. Em casos de infecção pré-natal ou neonatal, a cinomose pode causar imunodeficiência nos filhotes sobreviventes, tornando-os mais suscetíveis a infecções concomitantes graves, como o Parvovírus canino, bactérias como Clostridium piliforme, ou protozoários como Neospora caninum.

Figura 2. Patogenia sequencial da infecção pelo CDV. 1, O VC entra no trato respiratório via aerossóis e coloniza os tecidos linfoides locais, como as tonsilas. 2, A replicação viral primária ocorre nas tonsilas, nos linfonodos retrofaríngeos e brônquicos e no tecido linfoide gastrintestinal (GI). 3, Desses locais de replicação primária, macrófagos contendo CDV entram nos linfáticos que seguem de volta para o coração, onde entram no sangue como uma viremia associada a células mononucleares. 4, O vírus entra no sistema nervoso central (SNC) via circulação cerebral, onde se deposita nos espaços perivasculares dos vasos sanguíneos finos. 5, Como alternativa, o vírus entra nos vasos do plexo coroide e, por fim, no líquido cerebrospinal (LCS) e no sistema vestibular. 6, Como um fenômeno incomum em cães, o CDV pode seguir pelas vias nasais, através da lâmina cribriforme e em sentido anterógrado pelo nervo olfatório para o bulbo olfatório e o SNC, onde se localiza predominantemente nos lobos piriformes do córtex cerebral. Fonte: Greene, G.E. Infectious Diseases of the Dog and Cat, Elsevier, 2012.

Infecção do Sistema Nervoso Central

O CDV infecta neurônios e células gliais quando a viremia atinge uma determinada magnitude. A extensão dessa infecção depende diretamente da resposta imune sistêmica do hospedeiro, podendo o vírus permanecer no SNC por longos períodos. Em cães, o CDV, livre ou associado a linfócitos, pode alcançar o líquido cerebrospinal (LCS) através do plexo coroide infectado, disseminando-se para estruturas periventriculares. A natureza das lesões no SNC e a evolução da infecção dependem de diversos fatores, como a idade, a imunocompetência do hospedeiro e as características neurotrópicas do vírus.

A encefalite aguda ocorre geralmente no início da infecção em animais jovens e imunossuprimidos, caracterizando-se pela replicação viral direta e necrose neuronal. Isso frequentemente leva ao desenvolvimento de polioencefalomalácia.

A polioencefalite com corpúsculo de inclusão é uma forma variante de encefalite causada pelo CDV, que pode ocorrer após vacinação ou em cães com início súbito apenas de manifestações neurológicas.

A encefalite dos cães velhos está associada à persistência prolongada do vírus no cérebro, onde o CDV se dissemina entre as células por contato direto, sem brotamento através da membrana celular, permitindo que o vírus escape da detecção imunológica. A presença do antígeno viral estimula uma resposta inflamatória leve, porém prolongada, que eventualmente resulta em sinais neurológicos.

 

SINAIS CLÍNICOS

Sinais sistêmicos

O período de incubação dura, em média, cerca de uma semana, podendo se estender por até quatro semanas ou mais. As manifestações clínicas variam amplamente, dependendo de fatores como a virulência do vírus infectante, condições ambientais, idade, estado imunológico do hospedeiro e rapidez da resposta imune à infecção. Cães com infecção leve podem apresentar sinais clínicos inespecíficos, frequentemente indistinguíveis daqueles causados por outras doenças. A febre inicial, comum nas infecções naturais, pode passar despercebida. O primeiro sinal clínico observado é geralmente uma conjuntivite discreta, que pode evoluir de serosa para mucopurulenta (Figura 3). Em poucos dias, pode surgir tosse seca, acompanhada de aumento dos sons respiratórios ao serem auscultados.

Outros sinais clínicos incluem diarreia, inquietação, perda de apetite, febre recorrente e o desenvolvimento de hiperceratose no nariz e nas almofadas podais, conhecida como “doença dos coxins ásperos” (Figuras 4 e 5). Em infecções neonatais, pode ocorrer também hipoplasia do esmalte dentário, devido à interferência do vírus na formação dos dentes permanentes (Figura 6).

Figura 3. Conjuntivite serosa a mucopurulenta. (Portal Petlove)
Figura 4. Hiperqueratose nasal em um cão com Cinomose sistêmica. Fonte: Greene, G.E. Infectious Diseases of the Dog and Cat, Elsevier, 2012.
Figura 5. Hiperqueratose digital (“doença dos Coxins ásperos”). Fonte: Greene, G.E. Infectious Diseases of the Dog and Cat, Elsevier, 2012.
Figura 6. Hipoplasia do esmalte caracterizada por irregularidades na superfície dentária em um cão adulto. Fonte: Greene, G.E. Infectious Diseases of the Dog and Cat, Elsevier, 2012.

Sinais neurológicos

As manifestações neurológicas da cinomose canina geralmente surgem entre 1 e 3 semanas após a recuperação dos sinais sistêmicos. No entanto, não é possível prever quais cães desenvolverão distúrbios neurológicos. Em alguns casos, os sinais neurológicos podem coincidir com a doença multissistêmica, enquanto em outros, podem surgir semanas ou até meses após a infecção inicial.

Os sinais neurológicos variam conforme a área do SNC afetada. Os mais comuns incluem paresia, mioclonia e convulsões. O desenvolvimento de sinais neurológicos está geralmente associado a um prognóstico reservado ou grave. Além disso, mesmo nos cães que sobrevivem à fase neurológica da doença, déficits neurológicos residuais são frequentes, afetando a qualidade de vida a longo prazo desses indivíduos.

 

DIAGNÓSTICO

A cinomose canina é uma doença viral altamente contagiosa que apresenta manifestações clínicas variadas, incluindo sinais respiratórios, gastrointestinais, neurológicos e cutâneos, o que torna seu diagnóstico desafiador. Para confirmar a infecção, uma abordagem combinada de métodos laboratoriais, imunológicos e moleculares pode ser fundamental, permitindo maior precisão na identificação do patógeno, bem como na avaliação do estágio da doença.

 

Achados laboratoriais

Os achados hematológicos incluem linfopenia, trombocitopenia e anemia regenerativa, especialmente em neonatos infectados. Os corpúsculos de inclusão da cinomose são estruturas intracelulares formadas por nucleocapsídios virais, características típicas das infecções por vírus da família Paramyxoviridae. Essas inclusões podem ser observadas principalmente na fase inicial da doença e são úteis para o diagnóstico em esfregaços sanguíneos. Nos linfócitos, manifestam-se como estruturas grandes, ovais e de coloração cinzenta, enquanto nos eritrócitos são arredondadas, excêntricas e azuladas. Por outro lado, os corpúsculos de Howell-Jolly são remanescentes nucleares presentes nos eritrócitos, formados devido a falhas na remoção do núcleo durante a maturação celular. Sua ocorrência é geralmente associada a condições como anemia regenerativa ou disfunção esplênica. Apesar de também serem arredondados e azulados, possuem origem, estrutura e localização distintas em relação às inclusões da cinomose. As alterações bioquímicas, como a diminuição da albumina e aumento das globulinas α e γ, são inespecíficas, e filhotes infectados podem apresentar hipoglobulinemia devido à imunossupressão.

 

 

Imunocitologia

Técnicas imunofluorescentes e imuno-histoquímicas são ferramentas que podem ser utilizadas no diagnóstico da cinomose canina. A imunofluorescência é realizada em esfregaços de epitélio conjuntival, tonsilar, genital, respiratório e em células do LCS, sangue e urina, detectando o antígeno viral entre 2 e 5 dias PI, com diminuição à medida que os anticorpos aumentam. Os resultados são mais confiáveis nas fases agudas, pois falsos negativos podem ocorrer nas crônicas devido ao mascaramento do antígeno. Já a imuno-histoquímica utiliza cortes de tecido congelados ou embebidos em parafina para identificar o vírus em mucosa nasal, coxins plantares, pele dorsal e tecidos como baço e cérebro, sendo mais utilizados em diagnósticos pós-necropsia.

 

Detecção de anticorpos IgG/IgM

O teste de neutralização é o padrão para avaliar a proteção contra o CDV, correlacionando os títulos séricos ao nível de imunidade. Os anticorpos neutralizantes, direcionados às proteínas H e F do vírus, surgem em média 20 dias após a infecção e podem persistir por longos períodos na vida do animal, seja vacinado ou recuperado. Os Testes Rápidos Imunocromatográficos da Accuvet, por serem semi-quantitativos, permitem a detecção e mensuração dos anticorpos IgG e IgM, indicando os títulos séricos pós-infecção ou vacinação.

 

Detecção de antígenos

A detecção de antígenos do CDV pode ser realizada por meio de Testes Rápidos Imunocromatográficos da Accuvet, que são amplamente utilizados devido à sua praticidade e sensibilidade. Esses testes fornecem resultados em poucos minutos, sendo especialmente úteis para diagnósticos iniciais. Eles detectam antígenos virais em amostras de swabs conjuntivais, nasais, orais e/ou líquor, tornando-se uma ferramenta valiosa na triagem clínica, principalmente em casos com sinais agudos da doença. Quando utilizados em conjunto com métodos mais avançados, como o RT-qPCR, podem melhorar significativamente a precisão diagnóstica.

O diagnóstico baseado na detecção do antígeno viral em swabs de mucosas oculares, nasais ou em líquor é altamente recomendado, já que essas áreas frequentemente apresentam altas cargas virais. Para maior sensibilidade, em animais na fase respiratória da doença, o material ideal para análise são swabs das mucosas oculares e/ou nasais. Por outro lado, em animais que apresentam sinais neurológicos, como ataxia, perda de equilíbrio, incoordenação, paralisia, convulsões ou mioclonia – sintomas que podem surgir tanto na fase inicial quanto na tardia da doença –, o líquor é o material mais indicado para os testes.

 

A cinomose canina é uma doença viral multifacetada, caracterizada por uma infecção sistêmica que compromete diversos sistemas do organismo do animal, incluindo o respiratório, gastrointestinal, neurológico e tegumentar. Dada a variabilidade de sinais clínicos e a complexidade de seu diagnóstico, que pode envolver diferentes fases da doença, é essencial o uso de métodos laboratoriais seguros para a identificação precisa do agente etiológico e a avaliação do estágio da infecção. O diagnóstico rápido, por meio de testes rápidos imunocromatográficos de detecção de antígenos e anticorpos, é crucial para um manejo eficaz da doença e para a implementação de estratégias de controle, como a vacinação, que permanece a principal forma de prevenção. A abordagem precoce e assertiva na identificação da cinomose canina pode não apenas salvar vidas, mas também evitar complicações graves, como os distúrbios neurológicos permanentes, melhorando, assim, a qualidade de vida dos cães afetados.

 

 

 

Referências:

  • Microbiologia veterinária e doenças infecciosas / P. J. Quinn, B. K. … [et al.]; tradução Lúcia Helena Niederauer Weiss, Rita Denise Niederauer Weiss. Porto Alegre: Artmed, 2007.
  • Doenças infecciosas em cães e gatos / Craig E. Greene; tradução Idilia Vanzellotti, Patricia Lydie Voeux. 4.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.

 

Soluções disponíveis:

Os testes rápidos imunocromatográficos da Accuvet oferecem diversas vantagens no diagnóstico da cinomose canina. Por serem práticos e altamente sensíveis, esses testes permitem a detecção de antígenos virais diretamente em amostras de swabs conjuntivais, nasais, orais e líquor, fornecendo resultados em poucos minutos. Além disso, os testes Accuvet possibilitam a detecção e mensuração semi-quantitativa de anticorpos IgG e IgM, contribuindo para a avaliação precisa da resposta imunológica, seja em infecções ativas ou após a vacinação. Essa abordagem rápida e confiável é fundamental para decisões terapêuticas imediatas e auxilia na implementação de medidas de contenção e prevenção da doença, como a vacinação de outros animais suscetíveis.

Ao facilitar a identificação precoce da cinomose, os testes rápidos da Accuvet ajudam a minimizar complicações graves, como danos neurológicos permanentes, melhorando significativamente o prognóstico e a qualidade de vida dos cães acometidos.

 

  • Accuvet Cinomose Ag: Detecção de antígenos virais em swabs conjuntivais, nasais, orais e/ou líquor.
  • Accuvet Cinomose Ac: Avaliação semi-quantitativa dos anticorpos IgG e IgM.
  • Accuvet CDV/CPV Ac: Teste combinado para avaliação semi-quantitativa dos anticorpos IgG e IgM contra Cinomose e Parvovirose.

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